PEC da Impunidade parlamentar sofre derrota, mas ganha sobrevida em comissão

A tentativa de tramitação acelerada não emplacou e a Proposta de Emenda à Constituição 3/2021, batizada de PEC da imunidade parlamentar, mas também referida como PEC da blindagem ou da impunidade, será discutida em uma comissão especial, seguindo o rito natural do Congresso Nacional. O cenário ocorreu em detrimento da tentativa do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), que incluiu a PEC na pauta da Casa na última semana no intuito de votar o texto de forma célere.

A semana foi repleta de tentativas de costuras encabeçadas por Lira. A PEC foi apresentada na terça e na quarta já teve a sua admissibilidade votada pelos deputados. Longas reuniões ocorreram, e a relatora da PEC, Margarete Coelho (PP-PI), inclusive, sinalizou mudanças no texto para tentar angariar apoio dos congressistas que apresentavam resistência à proposta.

No entanto, a movimentação foi em vão. Já na noite da quinta-feira, houve a primeira derrota do presidente da Casa, com obstruções que resultaram no adiamento da votação para sexta-feira. Apesar da busca pela viabilização, o desfecho se repetiu e a pauta saiu, ao menos por enquanto, das análises prioritárias do plenário, para onde retornará após a tramitação da comissão especial.

Lira não escondeu a frustração. “Essa não deveria ser chamada PEC da imunidade. Deveria ser chamada PEC da democracia”, disse. “Essa Casa de novo, hoje [sexta] não consegue consensuar a alteração de um artigo. Não é um código, é de um artigo”, acrescentou ao anunciar que os líderes devem fazer a indicação dos membros da comissão até segunda.

A movimentação do presidente da Casa, ao longo da semana, em busca da aprovação da PEC desagradou lideranças partidárias, por conta da proximidade entre a tentativa de emplacar a proposta que promove mudanças na imunidade parlamentar e a prisão do deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ), detido no dia 13 de fevereiro por ameaçar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e defender o AI-5. Daniel defendia ter o direito de dar aquelas declarações baseado em sua imunidade de membro do Parlamento e a PEC traz em seu texto mudanças que, na prática, em alguns casos, vão dificultar a prisão de deputados e senadores.

O momento também pesou em relação à pandemia. Na semana que o Brasil vivenciou ameaças de colapso sanitário em diversos estados e registrou o recorde de número diário de óbitos, a tramitação de uma pauta voltada para o próprio Parlamento despertou resistência em parte dos parlamentares, inviabilizando a construção pelos 308 votos, que deveriam se repetir em duas votações, para aprovação do texto. Houve ainda forte reação da sociedade e de ministros do Supremo, que consideraram a PEC como uma afronta e uma retaliação, por conta da prisão de Daniel.

O deputado Raul Henry (MDB) frisou que a “opinião pública” foi a principal responsável por barrar a votação. Ele destacou que o projeto ganhou destaque em detrimento de assuntos mais urgentes. “Nada mais incorreto do que tratar de um tema como esse diante de tantas prioridades nacionais como as que temos: a pandemia ameaçando sair de controle, a população mais pobre desamparada pela falta do auxílio emergencial e as taxas de desemprego batendo recordes”, disse.

O parlamentar Daniel Coelho (Cidadania) ressaltou que a imunidade primordial neste momento é a da população. “Não há nenhum sentido, quando a prioridade tem que ser vacinar o povo brasileiro, uma discussão sobre imunidade para deputados que cometem crimes. Que na segunda-feira o Congresso volte a se reunir para falar de vacina, de saúde e do auxílio emergencial”, frisou.

No entendimento da cientista política e professora da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho), Priscila Lapa, Lira falhou ao tentar impor velocidade à tramitação da proposta. “Com certeza foi um erro. Ainda que seja uma pauta corporativista, que tenha o apoio dos membros da Casa, você tem que respeitar minimamente certos ritos. A gente vive ainda um momento de muita polarização política em que esses consensos são cada vez mais difíceis de alcançar. Então você tentar empurrar ‘goela abaixo’ é muito difícil, em um cenário de muita disputa política. o caminho continua sendo seguir o rito e construir consensos, e não empurrar na marra”, afirma.

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