Artigo do leitor: A COMPESA, A POLÍTICA PARTIDÁRIA E O DESSERVIÇO BEM PAGO

Pessoal, fiz um artigo sobre a COMPESA. Solicito paciência na leitura, pois é um texto longo. Podem compartilhar a vontade.

A COMPESA, A POLÍTICA PARTIDÁRIA E O DESSERVIÇO BEM PAGO

Por: Moisés Almeida

Nos últimos dias em Petrolina, a COMPESA – Companhia Pernambucana de Saneamento, novamente fez parte de uma série de críticas de moradores, representantes de movimentos sociais e até de políticos. É uma história que se repete e em sentido cíclico, retorna como se tivesse fadada a nunca acabar. A polêmica sobre seus péssimos serviços prestados à população petrolinense, segundo relatos de moradores nas mídias sociais, me motivou a escrever esse texto, fazendo uma pesquisa sobre o que tem ocorrido nesta trama ad infinita. Seguirei uma linha histórica, desde as primeiras manifestações de independência por parte do poder público municipal em relação ao controle do abastecimento de água e saneamento, e, mostrarei com dados numéricos, que a empresa é superavitária, sendo seu maior entrave, a política partidária, que dificulta uma maior relação entre a Empresa e seus serviços prestados à população de Petrolina.

Comecemos, pois pelo ano de 1975, quando no Governo do Prefeito Geraldo Coelho foi firmado um contrato de prestação de serviços, que valeria por 50 anos. Portanto, segundo essa pactuação, a Compesa prestaria serviços até o ano de 2025. Mas, faltando 24 anos para encerrar o contrato, o Prefeito de então Fernando Bezerra Coelho, resolveu retomar a exploração dos serviços, com participação da iniciativa privada, podendo privatizar até 40% das ações de água e esgoto. Era o ano de 2001, quando Bezerra Coelho encaminhou um Projeto de Lei à Câmara Municipal solicitando autorização ao legislativo. Em Petrolina houve muita discussão, especialmente no tocante à possibilidade de privatização dos serviços. Naquela época, depois de várias discussões, foi aprovada a Lei nº 1.023/01, de 03/04/2001. Seguindo com sua proposta de municipalização e privatização dos serviços, o prefeito, três meses depois encaminhou à Câmara Municipal outro Projeto de Lei, criando a Empresa Águas de Petrolina. Sem consenso e com muitas críticas a decisão, o legislativo aprovou a Lei nº 1.059/01 de 13 de julho de 2001. Lembro, que um dos políticos contrários a essas Leis foi o então Deputado Federal Gonzaga Patriota, que no plenário da Câmara Federal, no dia 24 de fevereiro de 2003, assim falou: “Como é perceptível, Senhor Presidente, o município de Petrolina, vivencia um de seus piores momentos na área de Água e Esgotos Sanitários. A prefeitura não resolve suas posições, a COMPESA não consegue melhorar sua performance e a população sofre com o descaso das autoridades municipais e estaduais”. Mesmo sendo contrário a decisão de Bezerra Coelho, o pronunciamento de Patriota na Câmara Federal nada adiantou.

É bom lembrar, que no ano de 2003 foi lançado por duas vezes edital de licitação com objetivo de alienar 100% das ações da Empresa Águas de Petrolina e a desestatização do saneamento da cidade. Porém, não houve quem se interessasse pelo certame, que foi considerado deserto pelo Tribunal de Contas. Foi também nesse ano, que houve uma primeira tentativa de cessação do contrato, tendo, o Município de Petrolina e a Compesa firmado Termo de Rescisão Amigável do Contrato de Concessão dos referidos serviços. Mas o acordo não foi efetivado e em 2004, a prefeitura ajuizou uma ação de obrigação para o acertamento de contas, que foi prontamente deferida pela Corte Estadual, “determinando-se, à época, que a COMPESA transferisse ao ente municipal os serviços de água e esgoto, além de determinar ao ente público que pagasse a primeira parcela da indenização ajustada”.

A novela continuou e o Prefeito Fernando Bezerra Coelho em 2006 recorreu ao Supremo Tribunal Federal, que decidiu que o município de Petrolina tinha o direito de operar seu próprio sistema de saneamento e abastecimento de água. Porém, Bezerra Coelho, aliado do então Eduardo Campos, assumiu uma secretaria estadual, passando a direção do município para Odacy Amorim, que resolveu, em 2007, assinar um novo contrato com a Compesa, autorizado pela Câmara Municipal de Petrolina, segundo a Lei 2039/2007. Todo o imbróglio criado à cerca das leis que municipalizavam e criavam a companhia municipal de água de esgoto, foram para o esquecimento. Isso é uma prova de que a relação Compesa e Município depende das articulações político-partidárias. Quando Fernando Bezerra não era aliado do Governo do Estado, a briga judicial foi instalada, mas quando o cenário mudou, logo um acordo foi firmado. Saliento que por esse acordo no Governo Amorim, a Compesa tinha se comprometido em sanear 98% de toda área urbana em 36 meses, aplicando um valor de R$ 180 milhões, sendo perdoada uma dívida da prefeitura em cerca de 20 milhões de reais. Porém, a Companhia não cumpriu o prazo acordado.

O cenário político partidário mudou novamente, pois se elegeu para comandar a prefeitura de Petrolina Júlio Lóssio no período 2009 a 2012, sendo ele adversário do Governo do Estado. Já em 2011, o Prefeito protocolou na Câmara de Vereadores o Projeto de Lei n. 013 de 02 de agosto, solicitando a retomada ao poder executivo da operação e serviço de água e esgoto, como também, a recriação da empresa Águas de Petrolina. E em 2012, a Agência Reguladora de Petrolina – Armup, apresentou ao prefeito o novo Plano de Saneamento Básico do Município, incluindo a quebra do contrato entre a Prefeitura e a Compesa. Nesse mesmo ano, pelo decreto de número 160 de 30 de junho, foi declarado nulo o contrato de concessões dos serviços públicos de saneamento outorgado a Compesa, “por vício insanável que o macula desde a origem”.

Deste decreto, destaco dois artigos: “Art. 1º – Fica decretada a nulidade do contrato concessório, equivocadamente denominado de Termo Aditivo e celebrado nos idos de 2007 entre o Município e a COMPESA – Companhia Pernambucana de Saneamento, com a interveniência do Estado de Pernambuco, por vício insanável de ilegalidade que o macula desde a origem.” “Art. 3º – Fica ratificada a instauração do procedimento licitatório, na modalidade de Concorrência Pública, no qual se assegure o princípio da ampla competitividade em prol da coletividade.” Saliento ainda, que no Artigo quinto, para que não houvesse solução de continuidade, a Compesa continuaria prestando os serviços, podendo inclusive, participar do processo licitatório. Todavia, mesmo com o Decreto em vigência, nada ocorreu concretamente.

Essa novela continuou e o processo que se arrastava na justiça federal, em 2016 teve dois pareceres importantes: do Ministro do STF Ricardo Lewandowski e de Rodrigo Janot da Procuradoria Geral da República. O primeiro emitiu decisão favorável ao município de Petrolina na disputa contra o Governo do Estado e o segundo, pelos agravos regimentais na Tutela Antecipada, determinou que “demonstrado, indubitavelmente, o risco de lesão à ordem pública, sobretudo à ordem jurídico-constitucional, tendo em vista que, ao impedir a retomada, por parte do Município de Petrolina, da titularidade dos serviços públicos de água e esgoto, a decisão objeto deste incidente afronta os dispositivos constitucionais regentes da matéria, não se mostrando razoável, diga-se mais uma vez, que permaneça situação de verdadeira usurpação da competência municipal de organizar e prestar o serviço público em questão. Ante todo o exposto, opina a Procuradoria-Geral da República pelo desprovimento dos agravos regimentais, mantendo-se a decisão que deferiu o pedido de suspensão.” Já estávamos no segundo semestre de 2016 e se aproximava o pleito eleitoral municipal. Devido a essa intercorrência, mais uma vez, nada aconteceu.

O candidato de Júlio Lóssio não ganhou a eleição, e o cenário mudou novamente, pois, em 2017 assumiu o governo municipal Miguel Coelho, então aliado do Governador Paulo Câmara e tudo voltou à estaca zero. Segundo informações de blogs locais, um dia após a posse, o Prefeito e o Diretor Regional do Interior da Compesa Marconi de Azevedo, fizeram visitas a alguns bairros da cidade e pactuaram ações que consistiam em serviços de desobstrução da rede coletora, recuperação de poços de visita, interligação de redes condominiais, entre outros. Mas essa parceria parece não ter durado seis meses. Seu pai Fernando Bezerra Coelho abriu uma frente de oposição ao Governo do Estado, lançando-se pré-candidato ao Palácio das Princesas, e de novo a relação com a Companhia Pernambucana de Saneamento partidarizou-se. Desde o segundo semestre de 2017, o então Prefeito Miguel Coelho tem mudado o tom em relação a Compesa, e, publicamente tem cobrado os investimentos prometidos pela Companhia. Em recente entrevista numa rede local de Televisão, Miguel defendeu à municipalização ou até mesmo a privatização dos serviços de água e esgoto do município. Mais uma prova do uso partidário nas relações entre a Prefeitura e a Empresa, atrasando novamente os pactos firmados.

Não podia deixar de comentar nesse artigo, alguns números do Plano de Saneamento Básico do Município de Petrolina, originado pelo Processo administrativo 092/2011, da prefeitura municipal de Petrolina, através da Comissão Permanente de Licitações com a Carta Convite 021/2001 de 20 de abril de 2011 e contrato 111/2011 firmado em maio de 2011.Por que é importante falar desses números? Porque esses números revelam os montantes de projeção de receitas e despesas da Compesa em Petrolina, entre os anos de 2011 a 2041. Então vejamos: O contrato seria no valor global de 2,8 bilhões de reais para os 30 anos. Em relação às despesas no primeiro ano (2011) o valor seria de R$ 23.095.484,00. Já as despesas do último ano (2041), estavam em torno de R$ 47.490.173,00. O valor total das despesas nos trinta anos de contrato é R$ 1.094.097.586,00 (Um bilhão, noventa e quatro milhões, noventa e sete mil e quinhentos e oitenta e seis reais). Porém, o que mais interessa a população petrolinense são as RECEITAS. Primeiro ano: R$ 42.916.887,00 e último ano: R$ 109.358.775,00. No plano tem um investimento em saneamento de R$ 428.284.859,00. Fizeram as contas do lucro da Empresa? Então vejamos a matemática: Receitas – R$ 2.826.459.346,00 (Dois bilhões, oitocentos e vinte e seis milhões, quatrocentos e cinquenta e nove mil, trezentos e quarenta e seis reais). Despesas e investimentos – R$ 1.522.382,445,00. Descontando as despesas das receitas, existe um lucro líquido nos trinta anos de 1.304.076,901,00 (Um bilhão e trezentos e quatro milhões, setenta e seis mil e novecentos e um reais).

Depois de números tão absurdos, alguns questionamentos precisamos fazer: Se a projeção entre 2011 e 2041 é essa, por que a população de Petrolina sofre tanto com o desserviço da Companhia? Se e empresa é superavitária, por que em dois leilões não apareceram ofertantes? Quem está lucrando com tanto descaso? Por que a população fica refém do Governo do Estado e do Governo Municipal, que dependendo da política partidária, fazem e desfazem os acordos? Não seria o caso de municipalizar os serviços e com o lucro mensal, aplicar em melhoria na periferia, que tanto sofre com o desdém?

A que conclusão chegamos? Enquanto uma Companhia como essa estiver dependendo da política partidária, nenhuma solução será levada adiante. Não é possível que prefeitos e governadores deixem a água e esgoto e, portanto, a saúde, a mercê de seus caprichos políticos partidários. “Demulcet multum dulcis promissio stultum” – as doces promessas são uma grande lisonja para os tolos.

A população deve deixar de ser tola exigindo que os serviços pagos, e, bem pagos, sejam realizados. E, portanto, não se deixe enganar pelos governantes-negociantes da vontade popular, que tanto tem atrapalhado a vida dos petrolinenses.

Moisés Almeida/Ex-diretor da UPE em Petrolina

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